sexta-feira, 4 de junho de 2010

Introdução

Dois anos. Caminhando para três. Esse é o tempo que "Inferno dos Maremotos Pequenos" ficou no ar em outro site. Dois anos atrás eu precisava de alguma forma dizer coisas indizíveis. Eu precisava de alguma forma aceitar alguns problemas. Para isso, a única saída encontrada foi a escrita.

Sempre aceitei a escrita como libertação e pratiquei com certa dedicação. A transição de 2006/2007 foi difícil e naquele momento diversos escritos nasceram. Escritos que lidavam principalmente com situações íntimas. Escritos que traziam à tona problemas que ignorei. Ao dar espaço para essas palavras, dei voz aos meus próprios medos. Solidão, impaciência, dor, incompreensão. Medos que deram vida aos textos e que, de certa forma, transformaram-se em poemas. Esses poemas não só são exemplos de confissões, mas também da necessidade de libertação.

Dizer que me arrependo é recusar a beleza da complexidade que cada um evoca. Hoje eles funcionam como um lembrete. Ontem eram o meu sangue. As situações ainda são vivas na memória e, se compreendo tudo de uma nova ótica, grande parte vêm da leitura desses poemas.
Hoje abro mão daquilo que eles significam. Abro mão de vê-los como um limbo. Hoje quero vê-los como realmente são: memórias.

Homogêneos

Homogêneos

Eu preciso de uma mente mais aberta
Você sempre diz que a minha vida está de ponta-cabeça
e eu não reclamo
Não somos homogêneos, somos?
Estou frustrado, estou cansado
e sem paciência para ouvir alguém
Você está ultrapassando meu limite,
a minha divisa de intimidade
Sua curiosidade é incompreensível
Eu não me adapto tão fácil,
gosto de não mudar e cuspir indiferença

Eu preciso de mais espaço
e menos propostas para topar
Eu não pulo dentro e caio morto
Gosto d’estar vivo e, às vezes, sangro
Você não curte isso?
Você se preocupa com sua rotina
com sua mãe – sua grana – seus débitos
Seu tempo é curto demais para ser vivido?
Não dá p’ra arcar com isso
Você, agora, vai dar p’ra trás?

Eu quero mais clareza
Um manual de instruções e de boas maneiras
cairia bem
Sim, eu não sei me portar à mesa
Não, eu sei bem minha auto-advertência

Estamos nós falando sobre a mesma coisa?
Você pergunta s’eu não calo a boca

Eu peço demais?
Só quero menos ambivalência e menos problemas
Ambigüidade me faz regredir
E você não me põe p’ra frente
Quero uma tempestade com calmaria após
Estou mais calmo ou menos sereno?
Se você não se importar
pare de tentar me analisar

Eu preciso de menos estresse
Você fecha a porta ao sair?

Bilateralidade

Bilateralidade

Não vi os sinais novamente
Não fiz algo para evitar
Não movi uma palha na esperança
de você mover antes ou mais rápido
Não me deixei compreender os motivos
Mesmo eles estando ao meu alcance
Por mais uma vez eu quis crer
que não era só uma coincidência

Não aprendi qu’esperar não leva a lugar algum
Quis desenhar bilateralidade onde eu sim–
plesmente não estaria jamais
Abri espaço para você e fugiste assim mesmo
Não reparei se o espaço era amplo
Meu interesse não era tão claro
que você apenas não sentiu?

Querer morrer agora seria a coisa mais racional?
Seria você vítima desse crime ou da autoria?
Ficamos íntimos no pessoal?

Não sabia o que seria perfeito ou errado
Não percebi que estava bem como estava,
bastava agradecer pelo o que já tinha
Não sabia que ser romântico me faria mais
compatível com você
Fosse mais uma questão de interpretação que
de simples compreensão dos fatos

Não fui bem claro com as intenções
Não sei se deu errado,
pois não houve certo em momento algum
Não soa melhor avançar esse estágio
e pular para outra fase?

Quem seria a vítima?

Seus Sonetos I

Seus Sonetos I

Espero que passem os bons dias
Que o nosso vão vivido te culmine
Repetir-se-á sob suas demolidas dálias
Apodrecerão os jardins que não me são bens

O mal impregnará na raiz
Correrá pelo seu sangue
— pelas veias que tanto aquiesci
de estar ao meu alcance

Não bastam boas intenções
Se você apenas crê nas secreções
Eu não posso mais salvar almas

Espero um bom dia na sua base
— Atravesse seus problemas nesta fase
E talvez consigamos um objeto lá mais tarde...

Mar Dentro

Mar Dentro
Sobre o amanhecer de Novembro

Olhando a valentia
do mar na sua luta com as pedras
Meu dedo em riste
para o nascente solidário sol
e meu rosto triste encorajava
o questionamento de tudo
― e eu sabia da volúpia ao seu redor
Também descobriria a efemeridade ―
E hoje durmo com o sentido
da doce conotação de dar o coração p’ra
alguém ― e tê-lo empalhado ―
Ainda sinto os pensamentos
efervescendo naquele nascer do sol.

Fugidio

Fugidio

Vejo uma pequena redoma
domada
líquido preso no seu formato
como eu no seu mundo

Alvura faz parte do
contexto para essa análise

Vejo escuridão dentro
rasgando
Frio caça a sua caça
e suas luvas não esquentam mais

Estaca presa
Na corpulência de minh’alma
Não sinto mais prazer
Sinto a corrente

que arrasta
ou eu – ou você
para a vasta
imensidão

da dúvida e do rancor
do silêncio – do terror

fuja, por favor
chances
você ainda as tem!

não prendo-te e não
hás de prender-me
Estou te atando
Como fogo destrói a folha seca
Uma vez trocamos de lugar

Insidiosos
seremos sempre
e eu ainda vejo uma redoma
que guarda:
dois.

Do Tipo

Do Tipo

Você é do tipo real?
Você me prende nas suas pernas?
Eu entrarei em transe só ao chegar perto?
Tocar-te faz parte?
Par te sugere?

Seus olhos me induziam
Instruído ser, corrompido humano
Quanto mais verdade sei
Menos creio na existência
Sua desfalência mórbida infringe egos

Você é do tipo talentosa?
Você acaricia o tempo
com seu peculiar toque?
Você é do tipo dele ou meu?
Contrapartidas em comum

Você é do tipo de pessoa
que gosta do contato?
Do tipo que destrói vidas
só com um simples mover?

Do tipo móvel ou estável?
Estagnador?

Seus Sonetos II

Seus Sonetos II

Que sejas feliz na sua instância
E viva o cotidiano do jeito certo
Assim como as decisões são fortes o suficiente
Para persistirem nas ações pós-nós

Soa incompreensível que você perceba
Que todavia minha estrela cansou de coruscar
E meus pés estão no mais humilhante calcar
Para trazer à tona o risco que você velou em mim

E os anjos falam comigo na língua
Combinada na minha pútrida infância
Eles também se alarmaram da sua infâmia

Se este momento é o céu e o nirvana
Mando meu convite para os seus ateus
Assim ao menos alguém se incitará.

O Deixar-Ir

O Deixar-Ir

Então,
estou te deixando ir agora

Para alguém mais
saborear:

a alegria de estar
junto de você
até o amanhecer

Alguém mais irá provar

Então,
você pode ir agora

Na Noite Muda

Na Noite Muda

Trovões e relâmpagos na
noite muda
quebram o prazer deles,
descansados sob a janela,
contando estrelas e mártires no céu
Falo de coisas nuas que são mais vorazes
que mil terremotos e duas seringas
da sede de curiosidade derretedora de azulejos

O céu chuvoso não oferece apenas
um sistema de diferentes faces
mas também um mundo de
mil oportunidades e nasces
de ti a objeção:
essa teia de medos.
o refrão dos sedentos
incapazes de felicidade.

Ator

Ator

olhou-me
no prostrar das decisões
afetando a fé e confiança
e me descobri nu na sua frente
pedindo rendição e fiança―
dos crimes que nem
cheguei a cometer

atordoou-me
o seu fantasmagórico viver
Uma maturidade nos ossos
qu’eu ainda não havia provado
e me perdi no seu tablado ―
sendo o seu ator, sua sereia
caminhando em
seu cêntrico traslado

tem
ele
uma arrogância
filha-da-puta
que ação alguma
desnorteia.

Seus Sonetos III

Seus Sonetos III

Uma omissão que foi condicional
Correntes de um querer passional
Versões que estarão ao seu alcance
Mas que de mim serão apenas relance

Através da prisão ao seu redor
Não sentirás gotas do inexistente dó
O peso de uma insegurança domina
E o ódio nas bravas veias rumina

Um belo-enfadonho tussor descoberto
Pouco espaço para cartas na manga
Fadados ao resquício d’um certo entreaberto

Estigmas serão sempre a mesma pessoa
Sabes do cochicho que aqui ressoa
Sua voz nos ouvidos da tépida rapsódia (d’alguém mais)

Flores

Flores

Que essas flores queimem
tal qual o inferno queima
pó e cinzas virem

ar seco e enxofrado
perecer eterno dos mesmo

Palavras são baratas
assim como as ações
são de valor alto
para você

falha tentativa
de um lindo lar feliz
proclamado o êxodo alheio
seu e meu e nosso e seu e seu

Sente o ardente aroma
fresco?
não é brisa
São as flores

[ dezembro de 2006 ]

As Estrelas

As Estrelas

Eu não preciso da sua voz
Borborejando falsos palacetes
Na minha mente e memória
(faça-lhes mais fulgor)

Estrelas dormiam na sua primavera
não pude deixar de notar
este policiamento ao redor
(e eu não sei falar
sobre maturidade)

Das paralelas linhas sulfuricamente
ácidas nenhuma recebe mais atenção
que a sua flamejante atração

São esses olhos bestiais que seduzem
Do mesmo jeito qu’estrelas reluzem
O feitiço da negra ilusão cor ferrugem

As estrelas caíram na palma da sua mão
É possível o controle sobre este rio de sangue
que corre nestas veias
(e que se rendem)

Vazio

Vazio

Estou no miúdo fim
Entre o inferno dos maremotos pequenos
e perto do inferno dos pequenos
detalhes que brotam da igneoplastia
do ser ou não saber ser

E todo o sonho já não mais
é a recém-nascida esperança

Eu posso descrever a ação
do seu cheiro no inocente palpitar
Mas seria queimar a mão
no fogo que não é amigo familiar.

Perolada

Perolada

Essa inocência de cor perolada
Agora morta na sua caixa talhada
(foi assim que a Virgem Maria se sentiu?
— violada )

O Túnel

O Túnel

Jurei nunca mais ter tal sortido efeito
— promessas que se fizeram vãs —
Paganizei as conjurações e decidi destinos
E tudo morre agora na luz do túnel
Enquanto deserto a rotina dos nossos hábitos
Fatos falarão sobre si mesmos
E a escória em mim se surrará —
quase que automaticamente — por belos dizeres
apenas não-feitos.

Mesma Estação

Mesma Estação

O trem ia para meu destino
Sob a luz da primavera
que entrava delicada pelas janelas
Havia alguém do meu lado
e você entrou por aquela porta
Junto de um vento frio
que meu casaco não esquentaria jamais
Minha dúvida é s’eu senti frio
por te ver ou pelo vento (qu’eu devo
ter imaginado para disfarçar toda a
minha vulnerabilidade)

“E s’eu tivesse dado atenção?
E se eu descesse na mesma estação que você?”

Suas roupas estavam soltas e um
pouco desajustadas
Talvez isso indicasse você voltando para casa
Um sorriso retribuído seu,
e eu achei que sentaríamos lado a lado
Conversaríamos como velhos amigos
Riríamos dos velhos erros
Mas o banco esvaziou
e você ficou onde estava: longe
Uma chuva fraca cai agora

“Se eu tivesse chamado seu nome?
E se eu tivesse fixado meu olhar em você?”

Eu chamaria isso, relutantemente,
de destino
Você diria que é acaso
Eu não diferencio as coisas
E o vento continua e seus olhos
se encontram com os meus
Pensei nas decisões que nunca fizemos
Nos momentos que nunca vivemos
As verdades que nunca soubemos

O banco seguiu vazio,
assim como minha esperança de que
você se sentaria comigo...
assim como minha coragem de
dizer algo ali

Você desceu e me acenou com a cabeça
Eu retribuí com um “sim”,
p’ra, talvez, nunca mais te ver

Talvez, s’eu esperasse menos.
“Se eu tivesse me levantado e falado...
estaria vivo aqui ainda?”

Paredes Caladas

Paredes Caladas

As batidas na porta
Os passos no corredor
indicam que você será meu agressor
E acho que não adiantará eu gritar
Uma vez sabendo que ninguém virá

O barulho de você
“A importância de viver”?!
não cedo fugiram do incerto reaver
e as paredes estão caladas
O escuro atrás delas
E achei sim qu’alguém viria

A voz de você ecoa
No corpo a marca ressoa
E isso indica o que não entendi ainda
Passos distantes agoras,
e de fato ninguém veio.

"Aqueles que transaram comigo..."

Aqueles que transaram comigo,
favor, usar camisinha p’ra sempre
perigo de transmitir
Insegurança.

"Como faço para arder em você..."

Como faço para
arder em você
o desejo que a flama tem
pela gasolina?

Como criar em você
a necessidade qu’eu tenho
pela sua segurança?

Como trabalhar em você
a raiva impregnada
no meu peito agora vazio?
(Uma vez que ele está
na sedentária por suas mãos)

Como não cansarei
da espera meia-boca
que você açucara em mim?

Como posso saber
que seu ofício é apenas
disfarce para meus julgamentos
precipitados e errôneos?

Que Quero

Que Quero

Um sorriso
traria mais alegria
que todas as belas flores
trariam para a fútil dama

algumas palavras
ditas neste exato minuto
apagariam qualquer pequeno rastro
de um possível não-querer

Perseguir-te
Ter-te
Cuidar-te
é o que quero agora

Um abraço
será o suficiente
para me causar mais calor
que um intenso incêndio

Acompanhar-te
Necessitar-te
Ver-te de manhã
é do que preciso agora
que estás aqui
Acho que dá para ser feliz

Luz Acesa

Luz Acesa

Uma luz acesa
no cômodo

Você está em casa
e não atende

E se fosse eu,
que faria?

Já andei céu e mar,
céu e no ar,
céu e inferno por você

“Voltei do mundo nebuloso
quebrei meus ossos
por sua essência” penso

A luz apagou
foi você dormir?

Liberdade...

Liberdade...

Já vi o inferno cruzando
meu caminho certa vez
quando você chegou no meu espaço
Antes tão vazio
Outrora tão cheio
Agora seco e árido,
tal qual o deserto e sua fina estampa
Escravizante de meu lúcido anseio,
tornou-se sua irrefletida imagem

preciso de terapia?
Comprimidos e perfume
chegam a nos levar pro belo?
Inocente mar de memórias
avassalam
algo que segue
todavia doendo como ferida aberta
ao ar livre, ao ar livre
Mas jamais isso será liberdade...

Ao Vento

Ao Vento

Jogar-me-ei ao vento
No anseio de qu’ele me leve
Para algum belo lugar
E direi que ao menos
Alguém me fez feliz

Jogar-me-ei ao vento
Uma vez seus braços
Estando ocupados
E serei brevemente mais
Feliz do que sempre fui

"Não rimarei amor com dor..."

Não rimarei amor com dor
Farto dessa dupla
e de suas peças
Não cantarei mais minhas favoritas
Cansei de estourar tímpanos
e farto da impregnada
Coisa da mesmice do casual sempre

Não mandarei mais belas cartas
elas não úteis mais são
Não deixarei o pensamento fluir
— melhor qu’ele se dilua
na tempestade fria da mente —
Mas minhas mente não tem limites
— e é um labirinto esperando
uma luz —

E observo que tudo ainda está
no mesmo lugar
no lugar de sempre
onde sempre esteve.

Ilusões

Ilusões

Você não foi concebido com o intuito
Sua existência é exógena
carece do que nunca teve
Pobreza retalhadora e
você sonha com seus campos
Mas nada disso existiu
Ruas que esmaecem
na memória persistente
— é isso o que você terá, diz

Você sabe o perfeito esconderijo
— onde os vermes comem sua alma —
e sua diversão tem sido descobrir
o atalho para a saída

O frio na espinha
O árido seco
pela boca
e sua visão denuncia ilusões
e nada na sua crença da existência
é real o suficiente.

A Dança do Final

A Dança do Final

Mãe, mãezinha, vértice das vozes
Fuja dos seus vis lares
Para os braços mentirosos de um homem
E escolha viver o sonho dele, não o seu

Dance, dance para ele
Finja sua não-opinião e entre em seu carro
Cruze as lágrimas no seu diário
Mas descruze as pernas ao acender de luzes

Altere o sentido do universo antropocêntrico
Corra das suas falhas, da sua seda cortada
Seja uma bom donzela e dance para ele

É por ele que seus olhos estão
deliberadamente crescendo sem receio?
Mãe, mãe, foi seu veneno voluntário

Vá escapar agora e não há escapatória
Sinta a flecha atravessada no seu coração
que você tanto pediu aos seus anjos
Para onde foram agora que precisas?

Mãe, sem indagações então
O homem está ali e sabe sobre você
Que você goste de dançar
a dança do final daqueles sem fim.

Afirmação

Afirmação

Basta um eloqüente par de calças
Para te encharcar do seu elixir
Ansiedade para a sua curiosidade

Esmaecido tom vocal
A corda de subida não
me serve de descida

Mágica é manter vivaz
As promessas vagas
— mantenha-nas vivas —
pela imagem consistente
do ainda aqui doce menino

Acha que isso
Entre as suas pernas
Pode intimidar?

Boa crença sua
Sorria e ria
Qu’eu ainda não morro

Equiparo-me jamais
para com árvores secas
no duro frio

Eu sou mutável
na questão da sua indecisão.

Vampiro

Vampiro

e eu juro que achei
que teríamos uma vida
Mas estou lixando cada pedaço
do meu corpo por sua presença
Sugaste toda a essência
como esses vampiros baratos fazem
Então faça falta na vida alheia
e cancele sua marca.

Não Me Viveria

Não Me Viveria

Belas árvores floridas
e o mar límpido mentiram
Você não me mostrou a realeza
Disse que não me mostrou
as promessas —
feitas no seu truque
e no seu paraíso redentor

E eu o tempo todo sabia
que não me viveria
E como eu queria

São imagens destituídas já
Sangue dos pulsos em um véu corrente
E sei diferenciar o gosto
que mais ninguém conseguirá
Lilás das suas vestes não se apaga
Imagino que se o tocar de dentes dói assim,
como seria a mordida?

Estável monitoramento eu odeio
por você não estar pisando no calo
Eu me deleitei por seus louros
e achei que você me viveria
Estou errado por ter acertado?
Você aceita a cumplicidade do culpado?
E mesmo assim você não me viveria.

Perpetrando

Perpetrando

Uma faca
com dois lados cortantes

Um vício
qualificado como perpétuo

Uma machadinha
para perfurar esta bolha inflamada

Um bom dia
nunca satisfaz a servidão da noite passada

Uma fala
suave nos ecos insistentes

Um pequeno ponto branco
se destaca no tecido negro.

Desespero

Desespero

“E não me
arrependo amargamente”
eu repeti por horas
a fio mansamente

Era de meu conhecimento
a química sutil
com a qual você riscava minha
pele
no auge da inebrietude do seu ser

“É melhor deixar assim”
diria a consciência
― alerta do agonizante
desespero que me é dado
em doses durante o dia

"Orgulho vivaz na altura de seus olhos..."

Orgulho vivaz na altura de seus olhos
É como se fosse um pequeno livro aberto
― um diário? ―
― um desafio? ―
E você criticou a minha fúria
direcionada para seu ato vil não-visível
Mas suas armas são as poucas
palavras que eu disse
Antes eu as tivesse retido

É isso o que ocorre quando
se dá a mão para o futuro
( segurar no incerto
não-palpável )

Definições (o primeiro do último)

Definições (o primeiro do último)

...e o que era incompatível,
surtiu um efeito compreensível
por ambos os lados
Eu disse que de fato tudo era diferente
Revirado o destino
Revidado certos problemas
eu jurei não fechar meus olhos agora

não é que o mundo é mesmo inexato?

idéias, nomes, vozes – achei que esqueci
e algo aqui dizendo para insistir
Como eu diria?
Como te faria compartilhar (disso)?
devagando isso foi
devagando não irá mais

Tremor involuntário contigo
Eu não me senti com 12 anos
O suor não partilhou do sol
A conjuntura do tempo titubeou por 10 minutos
Decidido o que ser feito
Denegrindo a hesitação
Você quer concretizar as minhas expectativas
Não admitirei jamais dizer
que elas concretizadas por você já foram

Amplitude no caminho antes abandonado

Um início é indício do fim d’algo
Congruemos que melhor assim seja
Cheiro, abraço, um riso, olhar
(bastou isso para conquistar)
O conotativo sentido de tudo eu já sei
Apenas não preciso expressar
Você já sabe que bastou um toque,
uma mão n’outra,
um alerta de “cuidado”,
mas ninguém correu.
E isso me encorajou.
E isso me inspirou a chancificar essa idéia.

Abortar a Cria

Abortar a Cria

Ei!
Você levou um tempo até me chegar
Levou tempo até gozar
E agora estou grávido do seu bebê
suas idéias, seus ideais
Caiu por mim
Desistiu de seguir
Agora então,
terei eu de abortar a nossa cria?

Pois eu não sou capaz de criá-lo só
E acabarei matando-o
assim como isso me mata,
por saber que é seu, seu, seu
corre nas minhas veias
Seria isso o tesão, porra?
Grite p’ra mim qu’eu devo abortar
a nossa cria.

18 é a Ex–Tensão

18 é a Ex–Tensão

Qual seria o revesso do avesso?
Como seria o complexo do fácil?
Qual seria o peculiar de todo normal?
E onde estaria a graça do abstrato?

Uma vez desfeito o trato
Viro e cuspo no prato

Dezoito é a extensão do mesmo
no meu mundo quadrado

"Quero saber o que foi o que eu soube..."

Quero saber o que foi o que eu soube
sobre este inócuo amor cultivado
por nós?

Terra Nas Mãos

Terra Nas Mãos

Chegando tarde
Lábios fechados, mas sujos – dele –

Sapatos na varanda e
bilhetes seus à mostra

Por que tal respiração ofegante?
Você esconde, – vejo nas suas mãos
mas mentir foge do seu
vocabulário

Se o passado está decidido
O futuro escorrega por minhas
mãos

que estão cheias de terra
cavei buracos à procura de você

Rosas eu plantei e cultivei
Mas eu que me matei, matei: morrer-me-ei
pela sua pessoa, pela sua prosa

Você não pode esconder
todos atrás de você
São muitos para seu pequeno
tamanho

que me parece frágil
mas vejo veneno em sua face

Olhos de um semi-deus-forte
Fragilidade à mostra
na sua selada superfície
Deixei-me adentrar
no covil de seu complexo interior
Carrego a
frustração

um dia amada
porém que corrói
“não combino com suas roupas”
você refugia atrás de palavras
solitárias em conjunto

Eu poderia agredi-lo
Poderia fazê-lo sumir
Mataria pela nossa
aclamada paz

Mas não irei
Ame-o
e nunca mais deixe sua
blusa em minhas mãos.

Todos Os Homens

Todos Os Homens

Todos os homens são assim
Todos os homens gostam de futebol
E curtem drinks, saídas, à toa
Mas por que eu não?

Todos os homens, deveras, são másculos
Todos são bravos heróis
marcados
pelo galés
cruzando através
mares ínfimos
e de si íntimos
Por-qual-razão-não-sou?

Todos os homens têm coragem
Corre em suas veias
o aruaque mais vivo
Qualquer homem curte qualquer trepada
e eu?

Todos os homens, talhados deuses
Todos na sua alta soberania
correndo
pelos prados
e eu fadado,
aqui acabado
resignado,
por cortes tatuados
na pele oca de coloração ofuscadas...

das rimas perfeitas
os homens gostam
do ofício maduro
regurgitação afoita

Todos os homens gostam
De sangue da carne
– inébrio desejo –
– jorrando escarlate aos seus pés –
eu me rendo ao seu modelo

Luxo

Luxo

Tenho em mãos mais
afeição que a vida
jamais me traria:

tenho em mãos
o coração d’um
inocente apaixonado

Ousas Tu...?

Ousas Tu...?

Ousas tu cochichar
tuas profanas frases
e declarações
só por míseros minutos mortais?

Ousas tu dizer-me
que teu desejo é inexplicável
― tão forte quanto
palavras e poemas,

Mas como vens falar
de amor ― aos meus pés
ajoelhar-se, prostrar tua fronte ―

se na realidade,
ousas tu estar já com
tuas asas domadas ― não precisas de mim, então ―

Criação (da Escória do Amor)

Criação (da Escória do Amor)

Tortura-me a simplicidade
Com a qual toquei seus vivos cabelos
A cumplicidade que havia na mais
pura palavra não-desenhada em tua boca
(dói-me saber; criei-te assim em minha mente
coisas qu’eu não fui capaz de ter de ti)

Corta-me o fio da memória que
destrói a susceptibilidade ruinante
Surra-me a idéia do seu respirar
e a possibilidade do nosso regicídio
(agora o cidadão bom há de tê-los
não devem passar de dois ou três
pensa-nele-mentos vãos)

“Não mais crie-o assim para ti”
diz-me o belo moço ao apertar
a minha
mão
(pior é saber que não fui eu a criá-lo)

Preciso

Preciso

Preciso de calor
Estou frio e seco
feito uma puta

Preciso de voz
para não perder a rédea
como cavalos sem donos

Preciso de palavras
expressivas para meu medo
compreensivas para com minha agonia

Preciso da imagem d’alguém
bravo o suficiente
forte que não me oprima

Preciso da não-solidão
tangida de nenhuma cor
ungida que acabe o rancor

Preciso d’uma solução
Não a saída simples
dos pequenos assassinos brancos

Preciso da renovação
Do gozo que irá me manter
cego, insólito do seu prazer...
alheio.

Au Pair

Au Pair

Sempre foi explícito
E os desejos em mim, evito
Sempre foi retratado
Cobiçar o que é alheio, pecado

Sempre foi opressivo
Olhos atentos-camuflados, esquivo
Sempre foi frívolo
Dele estêncil discípulo

Capaz de cometer o original
Pressão estímulo racional
Capaz de ser seu au pair não tradicional

Cometeria as pálpebras sob sua luz
Basta não um encantamento que reluz
Desnudo-te com minha cobiça – à cruz!

"Voz impotente já é o bastante..."

Voz impotente já é o bastante
Renúncia é o meu suficiente

Dia após dia eu esperava
Antes de saber que eu não podia ter controle
jurei que você de fato amava,
me conformei com pequenos fatos
Mas esta pequena vida me cansou
O cansaço nos afogou nas mentiras

Eu corri com medo de ser arrastado contigo
Sua imponência, um dia me deu confiança,
mas hoje de manhã me deu nojo
E saber que você está aqui me mata
A consciência é fato registrado
jamais apagado.

Poema das Belezas do Mundo ( Hélices )

Poema das Belezas do Mundo ( Hélices )

Certa vez quis eu ser dono
das belezas deste mundo ―
teria novamente a doce
menina sardenta
de quem fui o juiz da inquisição,
é isso mesmo que fui
E no meu novo mundo
a menina seria minha
assim como esse poema é
― pois só isso qu’ele
pode ser ―
Assim como essas hélices
transpõem o vento da janela
― fundo transparente sob cores falsas ―

Tempo

Tempo

Crianças
brincando
no balanço
na praça
no final da rua
lembro sorrateiramente
que é o fim
da minha era.

Sinal Aberto

Sinal Aberto

Se eu não posso controlar
minha própria escrita,
quem é o doce vilão
que brinca de
mal-fazer escritos
para me captar
por inteiro?

Tem ele dormido com meus medos
ou dançado com meus demônios?
Tem ele beijado Caronte para
conseguir passe livre?
( como eu tenho )

Não, não há sinal aberto
Eu sei que não controlo a minha escrita.

"Dias em qu'eu quero ser..."

Dias em qu’eu quero ser
dois três quatro cinco seis
Esses dias em que a diferença fez
mais sentido que viver

Por Um Minuto

Por Um Minuto

Por um minuto, eu teria mudado a sua vida
Teria feito sua noção de mim mais objetiva
Apagaria os vestígios meu no seu corpo
Fingir-me-ia de insolente aos seus cuidados

Por um minuto, teria retalhado menos seu destino
Teria fingido não ver seu erro quando ali estava
Pegaria de volta as palavras que disse
Encher-te-ia das promessas vagas

Por um minuto, não teria vivido ao seu apelo
Teria bebido menos do seu veneno estóico
Consumir-me-ia de folhas semblantes à você

Por um minuto, saberia qual o limite do meu ego
Teria saber o seu punhal em minhas mãos
Por um minuto, far-te-ia tanto mal que você jamais
( me esqueceria

Soneto da Derrota Dele

Soneto da Derrota Dele

Livre-se disso que você chama de
amor ― trabalhoso, afinco pessoal
Far-te-á bem nenhum segurar
esta bandeira ― estafa explosiva

Ele é a doença não receitada
E tampouco verificada em exames
Um breve relance de consciência
para aplicar a autodesistência

Queira não desvendar a extensão dele
― tão vago e contínuo e vazio
quanto a sombra e a própria escuridão

Afligir-te-á não a insaciável fome dele
Uma vez que seu campo fechado está
Ele não pode te dominar – a derrota dele!

Nosso Recife Colorido (ou as cores de nosso recife)

Nosso Recife Colorido
( ou as cores de nosso recife )

Branca como a neve ( nunca
eu vi neve, mas suponho )
sua pele era

Nela escrevi planos
e desejos para uma vida.
“Mais vale um pássaro na mão
que dois voando” ouvi dizer

É essa não-trasmutação
do ser que atraca a barca
no recife de corais

Mas nosso recife é
preto, amor
Negro como seus cabelos
e não mel como seus olhos
nem nevemente branco como sua pele

Nozes

Nozes

Somos
nós
a tal
noz?

apenas murcha,
descartável

E Rimos

E Rimos

Eu estava imaginando
Duas ou três noites
Contigo

E eu sorri
Triste, mas ainda assim
Sorri

Sonhei contigo
Na noite do dia
Em que Saddam morreu
— parece certo eu disse
você disse que não —
ainda assim

corri para você
e não posso contar
quantas estrelas brilham no céu
e eu corri
p’ra você

Não sei quanto vale o outro
Mas não sou bom com
pesos medidas e coisas deste tipo
E não sei mais se o certo
Ainda é certo
Mas não parece certo esses caras
se meterem entre nós

e você sorriu
disse que deixasse para

mas hoje eu te disse
que isso ficasse para lá
e vi a goteira sobre seu copo
o conta-gotas sorria com
seu objetivo cumprido

e eu ri
novamente
e você ficou com raiva
mas riu também
e rimos
até que era hora de ir

não sabia que essa
hora de ir era definitiva

[ 03-01-07 ]

Devaneio d’um Jovem São

Devaneio d’um Jovem São

Sujo e embaçado
desejo ordinário
É qu’esta alma viúva
se torna prostituta

Suntuoso calor
a brasa viva a água evapora
Transcendente vibração
multissecular
voz que perde seu tom

Naufrágio de toda
solferinizada
razão para existir

Um pote d’água
onde se afogam reverências
Fundo negro
Com lodo
não deixa escapatória

Em morte eu devo
ser bom
Maldito ego
para qual carrego
o compromisso herege.

Denovonovamente

Denovonovamente

As luzes por aqui não brilham
tão intensamente como naquela vez
em um dia do outono
Não me sinto à vontade
Nem só, nem junto, nem nada

Fui longe demais e cansei
Achei que te acharia naquele vazio
daquele instante
Nem sinal de seus olhos claros
Eu juro que vi um feixe de lágrimas
escorrendo através do seu platino chão

Você já se foi?
Agora ou antes?
Você me fez andar em círculos
círculos e círculos e círculos (e afins circulares )
denovonovamente

A menina está buscando a própria salvação
Você achou a sua, creio eu
Um precipício faz parte do contexto
Estou inclinado a fazer parte disto,
dessa bagunça que temos chamada rotina

Não pedi que sua idéia fosse respeitada?!
Você vá com calma agora então
Você vá agora

Você me deixa em círculos
em círculos, em círculos
mais uma vez
Não andei tão longe para nada
Minha voz pesou demais

Não preciso de você mais
Manter-me inteiro tem sido fácil
Esconda-se atrás de suas mãos
Vesti minha melhor roupa
Viso que me desintegrei vivo
Qual a sua aceitação disso?!

Estou andando em círculos
e você não está ali
círculos e círculos e círculos

Você não está mais ali

Serenata P’ra Lua (a premissa dele)

Serenata P’ra Lua
( A Premissa Dele )


Eu caminho sob os feixes prateados que
A luz oferece em troca do respeito e do silêncio
― mas nada posso eu oferecer
senão minha alva declaração febril
que necessito mais dele que você, lua,
sua infértil insana
ladra dos brilhos naquele rosto
Condena-me à infinita insônia
para de mim roubá-lo,
sua sorridente insegurança
trapaceira e voraz inveja
Não é à toa que duras pouco, vadia
Raiva me ilude,
sei que você irá vê-lo mais que eu
nesta vida, pois eu sou odiado
e quando para ti ele olhar
não minta mais, lua
Diga-lhe que tateio a sua volta
para esta praça
onde ofereço nada mais
que a minha declaração febril
que o quero loucamente
na alvura dos anseios
na mais entorpecida vontade
que não há de ser saciada
até a dele chegada ser realizada.
Por favor, lua.

Não Exatamente

Não Exatamente

Tive você ao lado por um tempo
Não sei se exatamente “ao lado” é certo
Começou 9 meses atrás
e eu elogiei seu fino gosto
Você comentou algo que não lembro
Acho que guardei por demasiado
e contínuo tempo
essa coisa frágil que me corrompia
não exatamente a alma,
mas sua presença é o suficiente
para me causar segurança e exímia força
Você não sabe o quanto eu preferia
estar molhado da chuva,
que estar molhado por lágrimas
Eu sei bem quando algo está errado
Não preciso do seu olhar desviado
Tampouco da sua indiscrição rosa
Cara, é preciso saber quando acabar,
quando se deve dar por acabado
Precisa ser tão difícil dizer
as palavras entaladas?
Você disse “acho que você passou
dos limites...” – onde está a ligação?
Este ponto não deveria ser final
Não exatamente, não deste jeito
Éramos tão perfeitos
Você gostava das minhas mãos
Eu me ajoelharia por você
Ainda assim, algo soava errado

Minhas escamas cederam
e eu não sei pular este capítulo
Deus, não sei quem mais
me fará tão feliz
Não tão cedo você aparecerá
para me dizer “tudo bem”
Culparei o tempo, a dor, raiva
tecnologia, transcendência e a razão
Mas a culpa é minha, sei
Conheceu os lugares escuros
de minh’alma e de minha mente
Ainda assim aprovou o meu
fútil clichê de viver sem emoção
Mas, ainda, sei quando algo vai errado
e você não sabe mentir
e eu não vou fingir
hora da mudança?
não exatamente sei se é mudança
Sei que estou molhado,
E está um dia quente,
e estranho...

[ 20-12-06 ]

Déjà Vu

Déjà Vu

Quem sou eu?
Onde estou?
Dói meu estômago
pela incessante caça às memórias
de dois bobos sonhadores
devastando a origem

Válvulas fechadas

O nojo ― o asco
e a angústia me
invadem
― Brotam sutilmente

‘Que me passa?
‘Que me aflige?
Memórias me afligem
apesar de nunca terem
existido
Sua existência é abstrata
tal qual o ontem.

Dia 28

Dia 28

Eu não tive medo
Não suei por hesitação na criação
Que doa a quem
doer
Que meu sangue até
desfalecer:
o corpo
a alma
tudo
se for preciso para provar
que não podemos comprar
uma absolvição

Eu não menti para você
sobre o projeto do dia 28
Os cientistas não podem
explicar
ou solucionar
Basta aceitar a ferida,
e seguir a rota dos não-mortos

Um pensamento flui
para minhas mãos suadas
e recalcadas
e eu acho que eu estou pronto
para desistir desta vil luta